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16 de Abril de 2024

O descumprimento de medida protetiva de urgência configura crime de desobediência?

Confira o entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca do tema.

Publicado por Flávia Ortega Kluska
há 7 anos

O descumprimento de medida protetiva de urgncia configura crime de desobedincia

O descumprimento de medida protetiva de urgência prevista na Lei Maria da Penha (art. 22 da Lei 11.340/2006) não configura crime de desobediência (art. 330 do CP).

STJ. 5ª Turma. REsp 1.374.653-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 11/3/2014 (Info 538). STJ. 6ª Turma. RHC 41.970-MG, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 7/8/2014 (Info 544)

Imagine a seguinte situação hipotética:

Maria decidiu se separar de João. Este, contudo, continuou a procurá-la insistentemente e a fazer ameaças caso ela não reatasse o relacionamento. Diante disso, Maria procurou a Delegacia pedindo que fossem tomadas providências. A autoridade policial lavrou o boletim de ocorrência e enviou um expediente ao juiz com o pedido de Maria para que João não se aproximasse mais dela (art. 12, III, da Lei n. 11.343/2006).

O juiz deferiu o pedido da ofendida e determinou, como medidas protetivas de urgência, que João mantivesse distância mínima de 500m de Maria e não tentasse nenhum contato com ela por qualquer meio de comunicação (art. 22, III, a e b).

Na decisão, o magistrado consignou, ainda, que, em caso de descumprimento de quaisquer das medidas aplicadas, seria aplicada ao requerido multa diária de 100 reais, conforme previsto no § 4º, do art. 22 da Lei n. 11.340/2006. João foi regularmente intimado.

Apesar disso, uma semana depois procurou Maria em seu local de trabalho, fazendo novas ameaças.

Quais consequências poderão ser impostas a João pelo descumprimento da medida protetiva?

  1. A execução da multa imposta; e
  2. A decretação de sua prisão preventiva (art. 313, III, do CPP).

João também poderá ser processado pelo crime de desobediência (art. 330 do CP)?

NÃO. O descumprimento de medida protetiva de urgência prevista na Lei Maria da Penha (art. 22 da Lei n. 11.340/2006) não configura crime de desobediência (art. 330 do CP).

Não há crime de desobediência quando a pessoa desatende a ordem e existe alguma lei prevendo uma sanção civil, administrativa ou processual penal para esse descumprimento, sem ressalvar que poderá haver também a sanção criminal.

Resumindo:

Regra: se na Lei, houver previsão de sanção civil ou administrativa para o caso de descumprimento da ordem dada, não se configura o crime de desobediência.

Exceção: haverá delito de desobediência se, na Lei, além da sanção civil ou administrativa, expressamente constar uma ressalva de que não se exclui a sanção penal.

Ex1: Marcelo foi parado em uma blitz. O agente de trânsito determinou que ele apresentasse a habilitação e o documento do veículo, tendo Marcelo se recusado a fazê-lo. Marcelo não cometeu crime de desobediência porque o art. 238 do Código de Trânsito já prevê punições administrativas para essa conduta (infração gravíssima, multa e apreensão do veículo), sem ressalvar a possibilidade de aplicação de sanção penal.

Ex2: Gutemberg foi intimado para testemunhar em uma ação penal, tendo, no entanto, sem justificativa, deixado de comparecer ao ato processual. Gutemberg cometeu o crime de desobediência. O CPP determina que o juiz poderá aplicar multa e condená-lo a pagar as custas da diligência, sem prejuízo do processo penal por crime de desobediência (art. 219). Assim, a Lei (no caso, o CPP) prevê punições civis, ressalvando, no entanto, que elas poderão ser aplicadas juntamente com a condenação criminal.

Ex3: Cleôncio foi intimado para testemunhar em uma ação de indenização por danos morais, tendo, no entanto, sem justificativa, deixado de comparecer ao ato processual. Cleôncio não cometeu o crime de desobediência. O CPC prevê que a testemunha faltosa será conduzida coercitivamente e condenada a pagar as despesas do adiamento do ato (art. 412). Contudo, a Lei (no caso, o CPC) não prevê a possibilidade de tais sanções cíveis serem aplicadas juntamente com a punição pelo crime de desobediência.

Fonte: Dizer o direito.


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18 Comentários

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Com certeza Flávia,

Acho que 2017 é o ano de questionar a efetividade das medidas de proteção, e o funcionamento do MP, Poder Judiciário e Polícias na aplicação da prisão cautelar nos casos de descumprimento. continuar lendo

Sim, e quando o descumprimento continua e a justiça ainda alega que não precisa ser feita a prisão de um sujeito nem mesmo ser colocada as câmeras porque o sujeito esta indo ver os filhos, que ele não paga pensão alimentícia e esta a mais de um ano com mandato de prisão por não pagar a pensão alimentícia, e ameaça e já houve tentativas de matar a solicitante da medida protetiva por estar cobrando a pensão alimentícia dos filhos, e mesmo com o mandato de prisão pela falta do pagamento o indivíduo não é preso não paga mais a pensão e o pedido de proteção se deu por causa dos direito dos filhos que o indivíduo quer deixar órfãos. Se ela continuar cobrando ele mata ela e ja tentou várias vezes. continuar lendo

Tema importante! continuar lendo

Quando o agressor desobedece o cumprimento determinado pelo juiz, e volta a agredir a vítima, pena imposta é privativa de liberdade. continuar lendo

Perfeitamente Dra, a "REITERAÇÃO de condutas delituosas e o DESCUMPRIMENTO das medidas protetivas simplesmente denotam uma propensão do agressor em cometer crimes, razão pela qual , haverá necessidade da manutenção de sua prisão que se mostra necessária para garantia da ordem pública em consonância aos arts. 312 e 313 , III , do Código de Processo Penal". continuar lendo

Nobres colegas, acredito que este entendimento do STJ enfraqueceu em parte as sanções previstas na Lei Maria da Penha, contudo, em alguns Estados da Federação, além da prisão preventiva e das multas previstas, o Ministério Público passou a denunciar o agente e/ou indivíduo pelo descumprimento das medidas na figura típica do artigo: 359 do C.Penal, c/c artigo: 5º , II e artigo: 7º inciso: II da Lei nº 11.340/2006, os juízes adotando a mesma linha de entendimento, recebe a denúncia, intima o denunciado e lhe oferece uma transação penal, havendo a recusa, o denunciado é processado incurso na supracitada figura típica e em muitas vezes condenado.
No entanto, ao realizar uma análise perfunctória da figura típica atribuída ao indivíduo e/ou agente, com todo respeito as vítimas, depreende-se que esta figura típica não se amolda em casos de descumprimento de medidas protetivas, sendo equivocado o entendimento, pois a determinação para o cumprimento das medidas, advém de uma ordem judicial de caráter provisório e não de uma decisão judicial definitiva da qual se amoldaria na figura típica do artigo: 359 do C. Penal em caso de descumprimento das hipóteses previstas no artigo: 92, incisos: I a III, do mesmo Diploma Legal. Por outro lado, constata-se que muitos indivíduos e/ou agentes que descumpriram medidas protetivas foram condenados em sede de 1ª instância nesta figura típica de forma equivocada. Não se pode ollvidar, que na maioria dos casos envolvem pessoas hipossuficientes, onde muitas delas, não conseguem contratar um bom profissional para defendê-las e tornam-se vítimas de uma condenação indevida. Não tenho a mínima intenção de desprestigiar as vítimas e/ou diminuí-las, que em sua grande maioria sofrem horrores nas mãos dos seus companheiros e/ou maridos desequilibrados, contudo, venho dizer que muitas destas condenações na figura típica do artigo: 359 do C.Penal são equivocadas para não dizer ilegais ante a atipicidade da conduta. continuar lendo

Ponto para o descrédito com as leis, as instituições e seus representantes.
A desobediência deveria sim, figurar como potencial agravante, pois foi o início e causa do processo. continuar lendo

Pelo próprio princípio da consunção existe um nexo de dependência entre o indivíduo se abster de ir à audiência. Ele não incorreria em desobediência caso fosse à audiência, e vice versa.

Agora troque:
"Gutemberg foi intimado para testemunhar em uma ação penal, tendo, no entanto, sem justificativa, deixado de comparecer ao ato processual" por "Gutemberg invadiu um condomínio e a casa de seu desafeto e o crivou de balas" e verá que dentro do ordenamento jurídico atual faz sentido o crime de desobediência penalizar apenas quando não há outra norma que penalize a conduta. Ou seja, a desobediência pode ser vista como o meio para não comparecer ao ato processual. continuar lendo

Não vejo sentido.
Procedimentos existem para serem cumpridos, ou caímos na velha conversa da protelação.
Não cumpriu? Responda por isso inclusive, também ou apenas, mas responda.
Quem sabe o Gutemberg não tenha deixado de ira à audiência exatamente para ir à casa de seu desafeto?
Um crime maior englobar o menor não faz sentido algum. É uma forma de impunidade.
Quando todos estiverem convencidos de que deixando de cumprir uma norma responderão por isso, quem sabe passarão a ver com mais atenção a existência e a importância delas? continuar lendo

Caro José,

Recomendo a você o filme "Minority Report - A nova lei" para o senhor refletir sobre os impactos do que propôs. continuar lendo

Eu não formo opiniões de forma apressada, Silvio.
Como não sou da área do direito, tenho observado que os profissionais da área se preocupam muito em conhecer leis, saber como utiliza-las da melhor forma (o que considero como mérito) mas poucos param para questiona-las.
Talvez aí esteja nossa diferença de opinião.
Modos diferentes de se olhar para o mesmo ponto. continuar lendo