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26 de Abril de 2024

A posse ou porte de arma quebrada configura crime?

Publicado por Flávia Ortega Kluska
há 8 anos

Antes de responder tal questionamento, é relevante trazer as seguintes premissas acerca da posse/porte de arma de fogo:

A posse ou o porte de arma de fogo desmuniciada configura crime

A posse (art. 12 da Lei nº 10.826/2003) ou o porte (art. 14) de arma de fogo configura crime mesmo que ela esteja desmuniciada. Trata-se, atualmente, de posição pacífica tanto no STF como no STJ. Para a jurisprudência, a simples posse ou porte de arma, munição ou acessório de uso permitido — sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar — configura os crimes previstos nos arts. 12 ou 14 da Lei nº 10.826/2003. Isso porque, por serem delitos de perigo abstrato, é irrelevante o fato de a arma apreendida estar desacompanhada de munição, já que o bem jurídico tutelado é a segurança pública e a paz social.

Neste sentido:

STJ. 3ª Seção. AgRg nos EAREsp 260.556/SC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 26/03/2014.

STF. 2ª Turma. HC 95073/MS, red. P/ o acórdão Min. Teori Zavascki, 19/3/2013 (Info 699).

A posse ou porte apenas da munição configura crime

A posse ou o porte apenas da munição (ou seja, desacompanhada da arma) configura crime. Isso porque tal conduta consiste em crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa o resultado concreto da ação. O objetivo do legislador foi o de antecipar a punição de fatos que apresentam potencial lesivo à população, prevenindo a prática de crimes.

Neste sentido:

STF. 2ª Turma. HC 119154, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 26/11/2013.

STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1442152/MG, Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 07/08/2014.

Para que haja condenação pelo crime de posse ou porte, NÃO é necessário que a arma de fogo tenha sido apreendida e periciada

É irrelevante (desnecessária) a realização de exame pericial para a comprovação da potencialidade lesiva do artefato, pois basta o simples porte de arma de fogo, ainda que desmuniciada, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para a incidência do tipo penal. Isso porque os crimes previstos no arts. 12, 14 e 16 da Lei 10.826/03 são de mera conduta ou perigo abstrato, cujo objeto jurídico imediato é a segurança coletiva (STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1294551/GO, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 07/08/2014).

Dessa maneira, a pessoa pode ser condenada por posse ou porte de arma de fogo mesmo que não tenha havido apreensão e perícia.

A posse ou porte de arma quebrada configura crime?

NÃO. Como vimos acima, não é imprescindível que seja realizada perícia na arma de fogo apreendida. No entanto, se o laudo pericial for produzido e ficar constatado que a arma não tem nenhuma condição de efetuar disparos, não haverá crime. É o que vem decidindo o STJ:

(...) Sendo a tese nuclear da defesa o fato de o objeto não se adequar ao conceito de arma, por estar quebrado e, consequentemente, inapto para realização de disparo, circunstância devidamente comprovada pela perícia técnica realizada, temos, indubitavelmente, o rompimento da ligação lógica entre o fato provado e as mencionadas presunções. Nesse contexto, impossível a manutenção do decreto condenatório por porte ilegal de arma de fogo. (...)

STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 397.473/DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 19/08/2014.

(...) Na hipótese, contudo, em que demonstrada por laudo pericial a total ineficácia da arma de fogo (inapta a disparar) e das munições apreendidas (deflagradas e percutidas), deve ser reconhecida a atipicidade da conduta perpetrada, diante da ausência de afetação do bem jurídico incolumidade pública, tratando-se de crime impossível pela ineficácia absoluta do meio. (...)

STJ. 6ª Turma. REsp 1451397/MG, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 15/09/2015.

Entretanto, ressalta-se que, se a arma quebrada estiver com munição eficaz, o agente poderá ser condenado porque o simples porte de munição (eficaz) já configura o delito.

Logo, para que não seja crime, o agente tem que ter sido apreendido com arma quebrada e desmuniciada ou, então, com arma quebrada e com munições ineficazes (deflagradas e percutidas).

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13 Comentários

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Posse e porte de arma de fogo não deveriam ser crime, mas fazer o que né? Após a vitória em 1922, consolidando seu poder, o regime bolchevique baniu as armas de fogo do inventário civil.

"O objetivo do legislador foi o de antecipar a punição de fatos que apresentam potencial lesivo à população, prevenindo a prática de crimes." Esse argumento é um absurdo jurídico, se pune por antecipação pela possibilidade do sujeito vir a cometer um crime, se for assim prendam-se todos, pois qualquer um, portando ou não uma munição/arma de fogo, pode vir a cometer um delito, nossas mãos, pernas, celulares, óculos, canivetes, chaves, carros, cintos, são armas certo, tendo possibilidade de serem usados para ceifar vidas.

Ps.: Nunca vi munição, exceto cartuchos de shotgun, ser disparada sem que haja um cano de alma raiada. continuar lendo

Perfeito comentário Marcus. continuar lendo

Entendo a proibição de porte de munição porque a arma pode ser produzida em casa com N objetos.

E nisso vejo uma ignorância dos magistrados e da opinião pública: Estamos em 2015, tem ferramentas e equipamentos a venda em toda esquina, produzir armas em casa é extremamente simples hoje, dá até pra pegar projeto pronto, via web, de clássicos tipo AR-15 ou AK-47. Proibir a venda em estabelecimentos comerciais não faz efeito em quem realmente quer se armar, seja devido ao contrabando ou à produção doméstica (Que não é relevante, mas pode vir a ser qualquer dia desse).

E proibição de materia-base pra produção de pólvora é inviável, menos ainda o controle da existência de munição país a fora. Fora a possibilidade de usar outras propulsões, hoje anda muito comum as armas de ar comprimido, as de 5,5mm com mínimas modificações ficam tão letais quando uma espingarda calibre 22.

Não sei qual a graça do esporte, mas em redes sociais vejo muito comércio de armas de pressão, elas no default de fábrica já machucam, mas com modificações pequenas passam a ser letais. Mas... a legislação foi feita por LEIGOS que vivem em 1915, dá nisso, se focam nuns itens e por ignorância esquecem dos outros.

Engraçado gente que defende a liberação das drogas pra evitar consumo clandestino, mas é contra a liberação de armas, provavelmente por ignorância técnica, desconhece a facilidade de produção clandestina desses itens.

Se liberar tudo impede o comércio clandestino, então vamos liberar drogas e armas. Eu apoio mas só se for os 2 juntos.

Boa parte das armas de guerrilha no mundo são feitas na Tailandia e vizinhos em fabriquetas domésticas, tudo artesanal, recebem banhos e acabamento para parecerem profissionais, mas pra "apenas atirar" a fabricação é simples. A munição é um pouco mais complicada (Por isso faz sentido proibi-la, se a intenção é deixar todo mundo indefeso) da fabricar em qualquer fundo de quintal, exige comprar uns fogos de artifícios (Porque essas porcarias barulhentas não são proibidas? Só servem pra incomodar, só servem pra idiotas expressarem a própria idiotice produzindo barulho) e modificar, com uma caixa de 10 foguetes de R$ 10 acho que dá pra modificar a pólvora pra umas 6 ou 7 balas calibre 22. Ah se os legisladores tivessem um pingo de conhecimento técnico do mundo que os cerca!

(Não, não precisa voltar à idade média usando besta/crossbow, dá pra fazer um fundo de quintal armas letais à pressão de ar ou mola, um país sem armas de fogo certamente viraria um país com mais armas letais com outros meio de propulsão, o mau caráter sempre arranja uma arma ofensiva pra cometer os seus crimes, não é a proibição ou liberação de armas comerciais típicas que vai mudar esse percentual gigante do povão que acha aceitável roubar ou atirar em alguém, ou ter filho, primo, irmão, tio ou vizinho vivendo no mundo do crime) continuar lendo

Concordo parcialmente com seu comentário, discordo somente da facilidade de produção de uma arma de fogo http://www.ehow.com.br/furar-raiar-cano-arma-fogo-como_19655/, qualquer um faz em casa não? *Calibre 12, qualquer um faz, concordo, agora a qualidade é meio duvidosa não ? O ser humano nunca será privado do poder/possibilidade de ceifar uma vida, se não for com arma física será com psicológica, a morte acompanha a vida, bem como a sociedade, querendo ou não somos animais e a natureza nos imbuiu com o animus necandi, quer seja para sobrevivência, quer seja para fins egoísticos. continuar lendo

Marcus R
Concordo que arma de qualidade é difícil, mas um cano simples pra praticar roubos e assaltos teria precisão em poucos metros, e os usos típicos de armas são justo assim, quase encostando na vítima.

Por isso também citei que é bem simples transformar uma arma de pressão em algo letal, porque num assalto, sequestro ou latrocínio geralmente há pouca distância, com 2m já acerta órgãos vitais, e a queima-roupa dependendo do local do cranio (Nuca, orelha, olho) há morte instantânea, então temos que temer essas soluções de fundo de quintal justo pelo tipo de crime que mais são praticados à mão armada hoje: À queima-roupa.

Já pra uma guerrilha militar com confrontos a distância realmente esse tipo de arma não tem utilidade. Mas as grandes quadrilhas tem acesso à contrabandos, não falta armamento militar apreendidos com traficantes, enquanto com pequenos assaltantes e criminosos "menores" nas ruas é sempre arma leve (Nas 3 vezes que fui assaltado parecia cal. 22).

Caso o agressor porte arma de choque ou faca ainda existe a corrida ou a luta, mas com uma arma letal a 1m (De pressão, ou caseira) eu não arriscaria a fuga. continuar lendo

Imaginei a seguinte situação: um bandido assalta uma pessoa com uma arma desmuniciada ou quebrada. A vítima reage e o mata/fere.

Pelos entendimentos 'brilhantes" acima, o bandido nem poderia assim ser chamado. Logo, parece que o criminoso da estória seria a potencial vítima.

Mais uma vez trago a reflexão: temos de escolher de qual lado queremos estar. Se contra ou a favor da sociedade. continuar lendo

Já ouvir falar em legítima defesa putativa? No seu exemplo é o caso, Portanto a "potencial vítima" seria absolvido pelo exercício da legítima defesa. continuar lendo

Obrigado pelo esclarecimento, Omar! continuar lendo

Seu discurso tem uma lógica controversa a partir do momento em que você separa a "sociedade" em dois lados.
Imagine você a seguinte situação: João é seu filho, viveu uma vida inteira fugindo dos próprios problemas, miséria, fome, descaso, ignorância, e então entregou-se ao mundo das drogas... ele se vicia. Começa a roubar. Não quer matar ninguém, mas precisa impor temor para conseguir o dinheiro da droga... resolve roubar José... estudioso, trabalhador, de família e anda com uma arma em sua cintura... assim que é anunciado o assalto, José, o bom cidadão, mata João à queima roupa, em legítima defesa...
quem perdeu nessa história?
Todos nós, caro amigo! Nós, sociedade, fracassamos profundamente. Perdemos em todos os lados. Infelizmente! continuar lendo

Lógica canhota. continuar lendo

Já vi julgados em que o réu foi inocentado pelo fato de ter sido preso com a arma desacompanhada da munição. Ao ver dos julgadores o fato desta não estar na posse, tampouco próximo ao agente tornaria a ação impunível em decorrência da falta de ofensividade de conduta.

É a exceção, pois na maioria dos casos condena-se pelo simples fato de portar/possuir a arma ou munição, concomitantemente ou não. continuar lendo