Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
26 de Abril de 2024

Há previsão expressa da prova emprestada no CPC/15?

Publicado por Flávia Ortega Kluska
há 7 anos

Um dos temas mais interessantes no Processo Civil é a prova. Neste artigo abordarei sobre a Prova Emprestada, no âmbito das provas cíveis do Novo Código de Processo Civil, que encontra respaldo legal, mais especificamente em seu artigo 372, para abordar sobre a matéria.

Antes considerada como Prova Atípica pelo Código de Processo Civil de 1973, na nova Legislação que entrará em vigor em 2016, a Prova Emprestada, passou a ser considerada como Prova Típica, passando a ter previsão e descrição em Lei, conforme já mencionado.

Desse modo, o Novo Código, condiciona a Prova Emprestada em respeito do Princípio do Contraditório, ou seja, as partes devem ser ouvidas, devem ter o direito de manifestarem-se sobre a utilização da prova advinda de outro processo.

Portanto, o estudo abordará a evolução da utilização da prova emprestada e sua aplicação de acordo com o Novo CPC, analisando o entendimento dos Tribunais sobre o tema e realizando uma breve análise do que pode vir a acarretar a partir da vigência da nova Legislação Processual Civil.

A Prova Emprestada

1. Conceito

Prova emprestada é aquela que, não obstante ter sido produzida em outro processo, é deste transferida para demanda distinta, a fim de produzir nesta os efeitos de onde não é originária.

Nesse sentido leciona a doutrina de Moacyr Amaral Santos:

“Muito comum é o oferecimento em um processo de provas produzidas em outro. São depoimentos de testemunhas, de litigantes, são exames, traslados, por certidão, de uns autos para outros, com o fim de fazer prova. Tais são as chamadas provas emprestadas, denominação consagrada entre os escritores e pelos tribunais do país. É a prova que “já foi feita juridicamente, mas em outra causa, da qual se extrai para aplicá-la à causa em questão”, define Benthan.”

Entende-se assim, como o material probatório produzido num processo e conduzido a outro, situação que gera infindáveis discussões no âmbito jurídico, eis que, segundo alguns doutrinadores, a utilização vulneraria os princípios do contraditório, devido processo legal, bem como feriria os princípios do juiz natural, da oralidade e imediação.

Assim leciona Fredie Didier Jr sobre a matéria:

“Prova emprestada é a prova de um fato, produzida em um processo, seja por documentos, testemunhas, confissão, depoimento pessoal ou exame pericial, que é trasladada para outro processo, por meio de certidão extraída daquele”.

A prova produzida ingressa em outro processo sob a forma documental, cuja força probatória será valorada pelo juiz, que não está adstrito a dar-lhe idêntico valor ao que teve nos autos em que foi produzida.

Não se deve olvidar sobre a conveniência do traslado de provas de um processo a outro, de tal sorte, que há o prestígio dos princípios da celeridade bem como da economia processual, a fim de se evitar repetição desnecessária de atos processuais já esgotados com o aproveitamento de provas pretéritas. Imperiosa, entretanto, quando tais provas diante das circunstâncias fáticas não puderem ser colhidas no atual processo e, forem indispensáveis.

2. A Prova Emprestada no CPC/73

No Código de Processo Civil de 1973, a prova emprestada, conforme já referido é considerada como prova atípica, sendo admitida, entretanto, como meio probatório de utilização moralmente legítimo.

Com efeito, segundo estabelece o art. 332 do CPC[3], o convencimento do juiz pode ser construído a partir de prova produzida e transportada de outra demanda.

A previsão contida no dispositivo acima não sofreu qualquer influência em razão do Código Civil trazer, em seu art. 212, os meios de prova admissíveis pelo ordenamento jurídico pátrio. Com efeito, a enumeração lá contida, da mesma forma que acontecia com a legislação civil revogada, é tida como apenas exemplificativa e não taxativa.

A razão de ser do art. 332 do CPC é de garantir a utilização de todo instrumento probatório, ainda que não encontre previsão na legislação processual, mas que, segundo a lição de Antonio Carlos de Araujo Cintra,

“seja idôneo para demonstrar ou para apurar a veracidade de alegações de fatos relevantes para a justa decisão da causa.”

Importante consignar, que a admissão de meios probatórios atípicos (como os indícios, presunções e a própria prova emprestada) foi uma inovação trazida pelo CPC de 1973 em relação ao seu antecessor, que não possuía disposição semelhante.

Nesse ponto, muito bem destaca Humberto Theodoro Júnior, a lei processual civil atual, neste ponto, “mostrou-se consentâneo com as tendências que dominam a ciência processual de nossos dias, onde, acima do formalismo, prevalece o anseio da justiça ideal, lastreada na busca da verdade material, na medida do possível.”[4]

No entanto, não é toda e qualquer transferência de elementos probatórios produzidos em um processo e transferidos para outro que se enquadra dentro daquilo que se costuma conceituar de prova emprestada; é o caso, por exemplo, da prova obtida no juízo deprecado, conforme bem destaca Eduardo Cambi:

“Assim, não integra a noção de prova emprestada a prova produzida no juízo deprecado, porque este juízo é um prolongamento de primeiro (v. G., a testemunha, não residente no juízo em que se processa a demanda, por não estar obrigada a sair da sua residência, presta depoimento no foro onde mora e seu depoimento é considerado como se fosse prestado perante o juiz da causa)”.

Através de atos processuais desta espécie cria-se “um intercâmbio e uma colaboração entre dois juízos para que o processo tenha seu devido andamento” sem que isso se consubstancie em situação que envolva a utilização da prova emprestada.

Atualmente, à luz do vigente CPC de 73, a Doutrina e os Tribunais tem admitido a Prova Emprestada, desde que respeitado o princípio do contraditório.

Dessa forma, havendo identidade de relação fática e tratando-se das mesmas partes é possível ao Magistrado, utilizar-se da Prova Emprestada, que tenha sido produzida em outro processo o que é comumente visto, nos casos de prova pericial ou ainda, de provas orais.

O Magistrado nesses casos, não fica adstrito a aceitar a prova que tenha sido produzida em outro processo, o que, todavia, tendo a ser recomendável, tendo em vista o princípio da economia processual, sem esquecer, entretanto, de atentar ao princípio do contraditório.

Dessa forma, verifica-se que apesar do CPC de 73 não dispor expressamente sobre a legalidade da prova transladada de outro feito, com a evolução natural do nosso direito, a mesma foi sendo aceita em muitos casos e aplicada, sempre em consonância com os princípios constitucionais da nossa Constituição Federal.

3. A Prova Emprestada no CPC/15

De acordo com o Novo CPC, a Prova Emprestada deixou de ser considerada como prova atípica, para ser introduzida como prova típica, encontrando previsão legal em seu artigo 372.

Nesse sentido, colaciona-se o dispositivo supramencionado:

Art. 372. O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório.

Verifica-se pelo dispositivo acima, que o Novo CPC, condiciona a prova emprestada ao princípio do contraditório, ou seja, as partes devem ser ouvidas, devem ter o direito de se manifestar sobre a prova emprestada. A parte prejudicada pela prova deve ser ouvida também, a fim de que verifique a sua concordância com a utilização ou não desta.

Segundo o entendimento do STJ, as partes de ambos processos, tanto o da origem como o de destino da prova emprestada, não precisam ser necessariamente as mesmas, para a sua utilização.

Todavia, consoante os recentes julgados do nosso Tribunal de Justiça, para a admissibilidade da prova emprestada, é necessário que, dentre outros fatores, haja identidade de partes entre o processo que pretende ela ser utilizada, sob pena de ofensa ao princípio do contraditório. Assim, verifica-se que o nosso TJRS, já vem aplicando o dispositivo constante no artigo 372 do Novo CPC, que passará a ter vigência a partir de 2016:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. COBERTURA DE SINAL DE TELEFONIA. PERÍCIA. PROVA EMPRESTADA. Das circunstâncias segundo as quais inexiste identidade de partes entre a demanda originária e a demanda atual, não se justifica o deferimento de prova pericial emprestada em respeito aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. (Agravo de Instrumento nº 70065363004, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Cini Marchionatti, Julgado em 04/08/2015)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROVA EMPRESTADA. PROCESSO SEM PARTICIPAÇÃO DO RECORRENTE. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AO CONTRADITÓRIO. Para que seja admitida a prova emprestada, é necessário que, dentre outros fatores, haja identidade de partes entre o processo em que se pretende seja ela utilizada e aquele no qual foi ela produzida, sob pena de ofensa ao princípio do contraditório. Não aceitando o Estado a utilização do laudo pericial produzido no outro processo, do qual não participa, não é possível sua utilização como prova emprestada. Precedentes desta Corte. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70066166612, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Almir Porto da Rocha Filho, Julgado em 07/10/2015)

Nesse sentido, importante frisar o ensinamento de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery que lecionam acerca da Prova Emprestada ao dizer que:

“a condição mais importante para que se dê validade e eficácia à prova emprestada é sua sujeição às pessoas dos litigantes, cuja consequência primordial é a obediência ao contraditório. Ve-se, portanto, que a prova emprestada do processo realizado entre terceiros é res inter alios e não produz nenhum efeito senão para aquelas partes”.

Tal entendimento, apenas foi introduzido em nossa legislação, pois já havia sendo há muito tempo admitido e aplicado por nosso Tribunais.

Atualmente, mesmo na vigência do Código de 73, a doutrina e os Tribunais, consoante já exposto, admitem a prova emprestada, desde que respeitado o princípio do contraditório. No Novo Código, tal entendimento encontra uma disposição expressa, o que poderá ensejar futuramente, em uma maior quantidade de casos, em que utilizando-se a prova transladada de outro feito, serão julgados de forma mais célere.

Ademais, à primeira vista, o empréstimo da prova do processo penal, por exemplo, para o processo civil, poderá também se aceito, eis que a disposição contida no artigo 372, apenas dispõe a respeito da prova produzida em “outro processo”, não fazendo distinção entre as esferas civil e penal.

Dessa forma, verifica-se que com o Novo Código houve um avanço, uma positivação da possibilidade de se admitir a prova emprestada.

Portanto, verifica-se que o Novo CPC trouxe um avanço no tocante a prova emprestada, antes considerada como ilícita pelo CPC/73.

Ocorre que com o passar dos anos e com a evolução do nosso Direito, verifica-se que a possibilidade de transladar uma prova advinda de outro processo, atendendo principalmente os princípios constitucionais do contraditório e, principalmente a economia processual, tornou-se mais do que eficaz.

Assim, acredita-se que na prática, com o advento do Novo Código, aplicando-se de forma mais frequente, acarretará em um processo mais célere, pois dispensaria como nos casos de prova pericial, uma nova perícia e todos os procedimentos que a envolvem e que acabam por dificultar o regular andamento do feito.

Por fim, acredito que não deve apenas ser observado o contraditório, conforme prevê a disposição contida no artigo 372 do CPC/15, devendo o Magistrado observar as demais garantias constitucionais, dentre elas a proibição de prova ilícita.

FILIAÇÃO NO DIREITO DE FAMÍLIA - Multiparentalidade, Paternidade socioafetiva e demais assuntos (coloque o e-mail AQUIe receba o artigo completo).

ATENÇÃO, colega advogado (a), confira a edição do Manual Prático do Novo CPC, revisto, atualizado e ampliado (120 petições cíveis, com comentários doutrinários e jurisprudenciais + bônus). Agilize seu trabalho!!

  • Sobre o autorAdvogada
  • Publicações677
  • Seguidores761
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoNotícia
  • Visualizações5435
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/ha-previsao-expressa-da-prova-emprestada-no-cpc-15/485842444

Informações relacionadas

Luma Dórea , Advogado
Artigoshá 2 anos

O Janeiro Branco nos lembra que saúde mental é problema de todos

Geruza Gomes, Advogado
Artigoshá 2 anos

A Importância do Processo do Luto

Rodrigo Leite, Procurador e Advogado Público
Artigoshá 12 anos

Prova emprestada no processo penal: limites e admissibilidade segundo STF e STJ

Tribunal de Justiça de Goiás
Jurisprudênciaano passado

Tribunal de Justiça de Goiás TJ-GO: XXXXX-27.2022.8.09.0174

William Sanvier, Estudante de Direito
Artigoshá 5 anos

Características das Normas Jurídicas

4 Comentários

Faça um comentário construtivo para esse documento.

Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)

Parabéns Doutora, como sempre trazendo artigos de suma importância, é prazeroso a leitura tamanho nível com que trata os mesmos. Abraço. continuar lendo

Mudança importante e que merece destaque! continuar lendo

Isso é muito importante , pois dar mais celeridade aos processos, na minha opinião, o advogado, antes da dar entrada em qualquer processo, ele fazer uma pesquisa sobre essa matéria, procurando saber se existe algum caso semelhante, facilitando o mesmo a ter êxito em sua ação., Parabenenizo pela excelente matéria, pois são poucos advogados que sabem disso. continuar lendo

muitor bom artigo..parabens à sempre atuante advogada continuar lendo