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20 de Abril de 2024

Segundo o STF, aplica-se aos processos criminais o art. 1.035, §5º do CPC/15?

A suspensão dos processos em virtude de reconhecimento de repercussão geral pode ser aplicada para processos criminais.

Publicado por Flávia Ortega Kluska
há 6 anos

O § 5º do art. 1.035 do CPC/2015 preconiza:

§ 5º Reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional.

O STF fixou as seguintes conclusões a respeito desse dispositivo:

a) a suspensão prevista nesse § 5º não é uma consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral. Em outras palavras, ela não acontece sempre. O Ministro Relator do recurso extraordinário paradigma tem discricionariedade para determiná-la ou modulá-la;

b) a possibilidade de sobrestamento se aplica aos processos de natureza penal. Isso significa que, reconhecida a repercussão geral em um recurso extraordinário que trata sobre matéria penal, o Ministro Relator poderá determinar o sobrestamento de todos os processos criminais pendentes que versem sobre a matéria;

c) se for determinado o sobrestamento de processos de natureza penal, haverá, automaticamente, a suspensão da prescrição da pretensão punitiva relativa aos crimes que forem objeto das ações penais sobrestadas. Isso com base em uma interpretação conforme a Constituição do art. 116, I, do Código Penal;

d) em nenhuma hipótese, o sobrestamento de processos penais determinado com fundamento no art. 1.035, § 5º, do CPC abrangerá inquéritos policiais ou procedimentos investigatórios conduzidos pelo Ministério Público;

e) em nenhuma hipótese, o sobrestamento de processos penais determinado com fundamento no art. 1.035, § 5º, do CPC abrangerá ações penais em que haja réu preso provisoriamente;

f) em qualquer caso de sobrestamento de ação penal determinado com fundamento no art. 1.035, § 5º, do CPC, poderá o juízo de piso, no curso da suspensão, proceder, conforme a necessidade, à produção de provas de natureza urgente.

Nesse sentido: STF. Plenário. RE 966.177 RG/RS, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 7/6/2017 (Info 868).

O legislador percebeu que havia no STF e no STJ milhares de recursos que tratavam sobre os mesmos temas jurídicos. Diante disso, a fim de otimizar a análise desses recursos, a Lei nº 11.672/2008 acrescentou os arts. 543-B e 543-C ao CPC/1973, prevendo uma espécie de “julgamento por amostragem” dos recursos extraordinários e recursos especiais que tiverem sido interpostos com fundamento em idêntica controvérsia ou questão de direito.

No CPC/2015 o tema é agora tratado nos arts. 1.036 a 1.041:

Art. 1.036. Sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de acordo com as disposições desta Subseção, observado o disposto no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e no do Superior Tribunal de Justiça.

Procedimento de julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos

1) Em primeiro lugar, o Presidente ou Vice-Presidente do tribunal de origem (TJ ou TRF) irá identificar e separar todos os recursos interpostos que tratem sobre o mesmo assunto. Exemplo: reunir os recursos especiais nos quais se discuta se o prazo prescricional das ações contra a Fazenda Pública é de três ou cinco anos.

2) Desses recursos, o Presidente do tribunal selecionará 2 ou mais que representem bem a controvérsia discutida e os encaminhará ao STJ ou STF (conforme seja Resp ou RE). Serão escolhidos os que contiverem maior diversidade de fundamentos no acórdão e de argumentos no recurso especial.

Art. 1.036 (...) § 1º O presidente ou o vice-presidente de tribunal de justiça ou de tribunal regional federal selecionará 2 (dois) ou mais recursos representativos da controvérsia, que serão encaminhados ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça para fins de afetação, determinando a suspensão do trâmite de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitem no Estado ou na região, conforme o caso.

3) Os demais recursos especiais e extraordinários que tratem sobre a mesma matéria e que não foram remetidos como paradigma (modelo) ficarão suspensos no tribunal de origem até que o STJ/STF se pronuncie sobre o tema central. Vale ressaltar que não cabe nenhum recurso contra a decisão proferida no Tribunal de origem que tenha determinado o sobrestamento do RE ou do Resp com fundamento no art. 1.036 do CPC 2015.

Interessante novidade introduzida pelo CPC 2015. Se o recurso sobrestado tiver sido interposto fora do prazo, não há motivo para ele ficar suspenso aguardando a decisão do STJ/STF.

Logo, a outra parte poderá alegar a intempestividade e pedir que ele não seja conhecido:

Art. 1.036 § 2º O interessado pode requerer, ao presidente ou ao vice-presidente, que exclua da decisão de sobrestamento e inadmita o recurso especial ou o recurso extraordinário que tenha sido interposto intempestivamente, tendo o recorrente o prazo de 5 (cinco) dias para manifestarse sobre esse requerimento.

4) Selecionados os recursos, o Ministro Relator do Tribunal Superior, constatando que realmente existe multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, proferirá decisão de afetação, na qual: I - identificará com precisão a questão a ser submetida a julgamento; II - determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional; III - poderá requisitar aos presidentes ou aos vice-presidentes dos tribunais de justiça ou dos tribunais regionais federais a remessa de um recurso representativo da controvérsia.

A providência tratada no item II acima (suspensão do processamento de todos os processos pendentes) está prevista no art. 1.037 e também no § 5º do art. 1.035 do CPC/2015:

Art. 1.037. Selecionados os recursos, o relator, no tribunal superior, constatando a presença do pressuposto do caput do art. 1.036, proferirá decisão de afetação, na qual: (...) II - determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional;

Esse sobrestamento é obrigatório, ou seja, reconhecida a repercussão geral, automaticamente todos os processos pendentes ficarão suspensos? NÃO. O Relator do recurso extraordinário tem a faculdade de determinar ou não o sobrestamento dos processos.

O art. 1.035, § 5º do CPC aplica-se indiscutivelmente aos processos cíveis. E quanto aos criminais? Se um recurso extraordinário versando sobre matéria penal for admitido no STF sob a sistemática da repercussão geral, o relator também poderá determinar a suspensão dos demais processos criminais que estejam tramitando no país e que envolvam essa matéria? Ex: o STF reconhece a repercussão geral no seguinte tema: “discussão se desacato ainda é crime”. O relator desse recurso extraordinário poderá determinar que os processos criminais que tratem sobre esse mesmo assunto ficarão suspensos? SIM.

Em qualquer caso de sobrestamento de ação penal determinado com fundamento no art. 1.035, § 5º, do CPC, o juízo de piso poderá, a partir de aplicação analógica do disposto no art. 92, caput, do CPP, autorizar, no curso da suspensão, a produção de provas de natureza urgente.

E a prescrição, como fica em tais casos? Os processos criminais ficarão suspensos, mas a prescrição também ficará paralisada? SIM.

A suspensão da prescrição nesses casos está prevista na lei? Existe algum dispositivo do CP tratando sobre essa questão? Não de forma expressa. Diante desta lacuna, o STF entendeu que deveria ser aplicado, por analogia, o art. 116, I, do Código Penal.

O STF afirmou que deveria ser feita uma interpretação conforme a Constituição do art. 116, I, do CP para afirmar que ele se aplica também nos casos em que o tema discutido no processo está afetado para ser resolvido pelo STF em julgamento de recurso extraordinário submetido à repercussão geral. Assim, a suspensão do prazo prescricional para a resolução de questão externa prejudicial ao reconhecimento do crime (art. 116, I, do CP) abrange a hipótese de suspensão do prazo prescricional nos processos criminais com repercussão geral reconhecida. A interpretação conforme a Constituição Federal do art. 116, I, do CP se funda nos postulados da unidade e da concordância prática das normas constitucionais. O legislador, ao impor a suspensão dos processos sem instituir, simultaneamente, a suspensão dos prazos prescricionais, cria o risco de erigir sistema processual que vulnera a eficácia normativa e a aplicabilidade imediata de princípios constitucionais. Além disso, o sobrestamento de processo criminal, sem previsão legal de suspensão do prazo prescricional, impede o exercício da pretensão punitiva pelo Ministério Público e gera desequilíbrio entre as partes. Desse modo, fere a prerrogativa institucional do Parquet e o postulado da paridade de armas, violando os princípios do contraditório e do devido processo legal. O princípio da proporcionalidade opera tanto na esfera de proteção contra excessos estatais quanto na proibição de proteção deficiente. No caso, flagrantemente violado pelo obstáculo intransponível à proteção de direitos fundamentais da sociedade de impor sua ordem penal.

A suspensão do § 5º do art. 1.035 do CPC/2015 aplica-se também para a fase pré-processual? Em outras palavras, os inquéritos policiais e investigações criminais conduzidas pelo MP, se envolverem o tema que está sendo discutido no RE, também ficarão suspensos? NÃO.

Assim, o sobrestamento de processos penais determinado em razão da adoção da sistemática da repercussão geral não abrangerá inquéritos policiais ou procedimentos investigatórios conduzidos pelo Ministério Público. O § 5º do art. 1.035 do CPC prevê apenas a possibilidade de suspensão dos processos pendentes que versarem sobre a questão debatida e tramitarem no território nacional. O inquérito policial e a investigação conduzida pelo MP não possuem a natureza jurídica de “processo”, sendo meros “procedimentos”.

A suspensão do § 5º do art. 1.035 do CPC/2015 aplica-se a todos os processos criminais que tratem sobre a questão debatida na repercussão geral? NÃO.

Não se mostra admissível, sob pena de ampliação injustificada do período de restrição do direito de liberdade do acusado, que a prisão processual perdure enquanto estiver suspenso o curso da marcha processual e do prazo prescricional concernente às infrações penais cogitadas.

Fonte: dizer o direito.

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4 Comentários

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Interpretação do STF acerca da repercussão do NCPC. Importante!! continuar lendo

obrigado por suas atualizações continuar lendo

Muito oportuno o artigo! Excelente exposição! continuar lendo

Excelente artigo.
Grato por publicar. continuar lendo